Esporte que consiste basicamente em levantar o maior peso possível, o LPO pode ser praticado a nível competitivo, como preparação física para outros esportes e por amadores para manter qualidade de vida
Por Yara Achôa, Fitness Brasil
19/08/2021
A origem é antiga. Acredita-se que o levantamento de peso tenha surgido há milênios, com o objetivo de encontrar a pessoa mais forte de uma determinada região. No século XIX, o esporte chegou à Europa e popularizou-se. Na China, era aplicado como uma das etapas de recrutamento do exército, enquanto entre os gregos teria a função de aquecimento para a prática de outros esportes. Tradicional nas Olimpíadas, o LPO faz parte do quadro de modalidades desde 1896, na Olimpíada de Atenas, na Grécia.
Segundo a Confederação Brasileira de Levantamento de Pesos (CBLP), as primeiras competições por aqui foram realizadas em 1910. Em 1946 foi criada a Liga Força e Saúde, no Rio de Janeiro, e no ano seguinte rebatizada como Federação Metropolitana de Halterofilismo. O esporte também foi organizado em São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. A CBLP foi fundada em maio de 1979, com sede em Belo Horizonte, e é a entidade que dirige a modalidade em todo o país. “Nos anos 1940 e 1950 tivemos nomes de expressão em LPO no Brasil”, lembra Alceny Neto, mestre em treinamento desportivo na cadeira de levantamento de peso olímpico pela Universidade Estatal de Cultura Física, Esporte e Turismo da Rússia.
Talvez por todo o histórico de associação ao levantamento de grandes pesos, com atletas corpulentos e fortes, a modalidade tenha ficado limitada a um nicho. Porém, a partir do ano 2000, três fatos influenciaram o “ressurgimento” do LPO: o resgate da preparação física de atletas de alto rendimento, as academias de “garagem” e o crossfit.
“Esse ‘esquecimento’ aconteceu porque no Ocidente, o fisiculturismo foi dominante durante as últimas décadas – e o objetivo do fisiculturismo é apenas estético. Mas há pouco mais de 20 anos, no que diz respeito à preparação física de atletas, o treinamento funcional voltou a utilizar os exercícios que sempre foram os mais eficientes para esse grupo, como os exercícios de saltos e o LPO. Também ganharam espaço as academias de garagem, precursoras do crossfit, que abriram as portas para os praticantes que, mais do que beleza, queriam ficar rápidos e resistentes – ou seja, queriam treinar ‘como atletas’. Isso influenciou a opção por exercícios diferentes dos utilizados no fisiculturismo. E o crossfit foi o impulso final que o LPO precisava. Antes, um exercício marginalizado (era proibido em academias brasileiras), passou a ser uma das estrelas das competições de crossfit. Essa visibilidade foi muito importante”, explica Riccardo Rambo, atleta, professor e personal trainer com aperfeiçoamento em treinamento desportivo e treinamento de força pela Academia Estatal de Cultura Física de Moscou e preparador físico nas Olimpíadas de Sydney 2000, responsável pela preparação da triatleta Mariana Ohata, e por mais de 100 atletas em mais de 22 modalidades ao longo das suas três décadas de experiência.
“Aos poucos o LPO foi sendo desmistificado, entendido como atividade física democrática que pode ser praticada até por amadores para a manutenção da saúde”, reforça Neto, que também é diretor da Federação Paranaense de LPO.
Especialista na utilização de LPO como preparação física de atletas de outras modalidades e no condicionamento físico e manutenção de saúde, treinadora de LPO nível nacional e docente na Academia Brasileira de Treinadores, do Instituto Olímpico Brasileiro (IBO) – Comitê Olímpico Brasileiro, Grazzi Favarato conta que começou a estudar a modalidade e aplicá-la em amadores por volta de 2009. “Chegou como uma vertente do treinamento funcional. Daí passamos a incluir alguns movimentos – claro que não os mais complexos, que exigiam habilidades específicas – na preparação física de atletas e como forma de fortalecimento e condicionamento para quem buscava atividade física para manutenção de qualidade de vida”, explica.
MÚLTIPLOS BENEFÍCIOS
O LPO – caracterizado pela execução de dois movimentos, o arranco e o arremesso – agrega exercícios tradicionais de fortalecimento que ficaram “esquecidos”. São movimentos de caráter global, utilizando vários grupos musculares ao mesmo tempo. “Essa é uma das características mais importantes e responsáveis pelo grande resultado do LPO”, garante Rambo.
“Promove aumento de força, melhora da consciência corporal, da flexibilidade, da amplitude de movimento, da coordenação e da postura, entre outras coisas”, resume Grazzi Favarato.
Pode auxiliar até a perda de peso. “Por ser multiarticular e recrutar vários grupos musculares, produz um gasto energético grande. Assim, aliado a dieta, torna-se um complemento interessante ao processo”, argumenta Alceny Neto. E ainda tem a vantagem de melhorar a composição corporal, já que favorece o ganho de massa muscular a partir dos estímulos de alta intensidade.
E mais: o LPO pode promover um aumento considerável da densidade mineral óssea, sendo um treino recomendável para a prevenção da osteoporose e até aplicado em processos de reabilitação.
“Além de todos os benefícios físicos, é uma atividade desafiadora e motivadora. O praticante se surpreende com a força que nem imaginava que tinha, especialmente as mulheres”, ressalta Grazzi.
O especialista Riccardo Rambo diz que não há restrições para a prática de levantamento de peso. Mas é preciso lembrar que existem três categorias de aplicação:
– LPO competitivo: aquele que assistimos nas Olimpíadas. É necessário ter boa genética e treinar muito, além de acompanhamento nutricional específico.
– LPO como componente da preparação física: entra como meio auxiliar para atletas de outras modalidades, que normalmente treinam com parte dos exercícios de LPO. O movimento fica menos complexo, mas propicia importantes benefícios, como a melhora da potência.
– LPO como fitness e wellness: a modalidade é adaptada para que possa ser realizada até por um idoso com osteoporose ou um sedentário que iniciou um programa de emagrecimento. Nessa categoria não é necessário levantar os pesos pesados do LPO competitivo.
PARA QUEM QUER ENSINAR
O que é essencial para o profissional que quer abraçar a modalidade e oferecer como um de seus serviços? “Nos últimos anos importamos a ideia de certificação dos Estados Unidos, então, profissionais fazem um curso de final de semana e pensam que estão habilitados a ensinar o LPO. Mas o ideal é que o profissional seja primeiro formado em educação física, pois os conhecimentos básicos e fundamentais que sustentam o LPO estão aqui. Depois é indicado um curso de especialização longo, como uma pós-graduação, para o entendimento inicial do LPO. Após isso, participar de cursos específicos e clínicas para o aperfeiçoamento técnico. Na Rússia, um dos países tradicionais no LPO, a formação de um treinador é extensa e específica”, recomenda Rambo.
Alceny Neto também aconselha cursos mais extensos, visto que existem cerca de 11 metodologias de ensino. Com a proximidade que o mundo digital trouxe, ele também considera importante a troca de informações entre os profissionais e a busca por referências, especialmente a partir das federações dos estados. “Considero importante ainda ter a vivência do esporte – ou seja, praticar o LPO. Isso ajuda na hora aplicar nos alunos”, avalia o especialista.
Nunca ter levantado peso, porém, não deve ser encarado como um fator limitante para o ensino da modalidade, pelo menos quando se trata do segmento manutenção de qualidade de vida. Além da dedicação a cursos, leituras e troca entre profissionais, recursos como vídeos e materiais on-line podem ajudar como complemento das aulas. “Hoje, com um celular ou tablet, você consegue mostrar a execução do exercício. O essencial é conhecer para atender”, diz Grazzi Favarato.
O LPO NA ATUALIDADE
Para Riccardo Rambo, na preparação física e no fitness/ wellness, o LPO está no ponto de sua maior ascensão. “Ele está em todos os lugares: academias, clubes e clínicas. E deve crescer muito mais, ficando cada vez mais ‘normal’. O público que mais procura são atletas de outras modalidades e praticantes de crosstraining (como o crossfit). Mas o público de clínicas (idosos, pessoas com dor) está crescendo bastante. As possíveis dificuldades são os equipamentos (que são bem específicos) e profissionais especializados. Já no competitivo temos um problema. As ações das federações e da confederação não resultaram no aumento da quantidade de competidores. Isso dificultará o aparecimento de atletas de alto rendimento”, analisa o professor.
“A modalidade, que é bastante democrática e pode ser praticada por todos os grupos de amadores, tem muito o que crescer. E se a gente pensar em termos de equipamento para academias, o investimento é bastante acessível – não custa 2% de um crossover”, diz Alceny Neto.
Entre as mulheres, o preconceito com a modalidade e a ideia de ficar musculosa e masculinizada também estão caindo por terra. “Felizmente a cabeça das pessoas está mudando. Tanto em relação a quem pratica, como a quem ensina. No próprio âmbito esportivo da Rio 2016, tivemos muitas mulheres fazendo parte do time, tornando-se referência para quem quer praticar e trabalhar com LPO”, finaliza Grazzi.
Com todas as vantagens, possibilidades de aplicação e perspectivas de crescimento, o LPO é uma modalidade que merece atenção no universo esportivo. Vale conhecer mais seja para praticar ou ensinar!
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