Por Luis Carlos de Oliveira, colunista Fitness Brasil
Sigo aqui meu compromisso assumido no sentido de empoderar os Profissionais de Educação Física para que possam atuar com competência, fluência e desenvoltura dentro de uma equipe multiprofissional da saúde, seja em uma unidade de saúde, em um hospital, em uma empresa ou em um centro de atividades físicas, clube, escola ou academia, sobretudo quando interagindo com outro profissional da saúde.
E hoje vamos conhecer o marco referencial da história recente da relação entre atividade física e condições de saúde – ou a origem do conhecimento sobre o risco de incidência de algumas doenças, sobretudo as DCNTs (Doenças Crônicas Não Transmissíveis) em relação ao envolvimento com a atividade física.
Nós, profissionais de Educação Física, atualmente temos a prerrogativa de integrarmos equipes multiprofissionais de saúde, devidamente reconhecidos como elementos essenciais nas ações de promoção da saúde da população. Somos capazes de promover uma condição de prevenção das doenças que mais acometem as populações mundiais e até atuar no tratamento e na recuperação de doentes, assim como descreve uma recente resolução do CONFEF (Resolução 391/2020) que dispõe sobre reconhecimento e a definição da atuação e competência do profissional de Educação Física em contextos hospitalares e outras providências. Mas esta condição não se deu facilmente, nem do dia para a noite. É resultado de uma longa jornada desde a histórica publicação de Jeremy N. Morris no importante periódico médico britânico The Lancet, em 1953.
Morris, médico britânico pesquisador na área da saúde ocupacional, conseguiu demonstrar em um estudo científico – em que comparou a incidência de doença coronária em trabalhadores do sistema de transporte londrino –, que as doenças coronárias se apresentavam com maior incidência nos motoristas do que nos cobradores dos famosos ônibus de dois andares. Você deve estar se perguntando: “tá, mas e aí?”
Para quem não sabe, a grande diferença entre estas duas atividades profissionais está exatamente na quantidade de atividade física diária. Os motoristas londrinos, assim como qualquer motorista de ônibus, em qualquer lugar do mundo, passam a maior parte da sua jornada de trabalho sentados, ainda que se movimentado no que a atividade exige.
Já os cobradores dos clássicos ônibus britânicos passavam sua jornada de trabalho se locomovendo por todo o veículo, conferindo os bilhetes dos passageiros, o que, ao final do dia, levava a uma considerável diferença na atividade física acumulada ao longo de sua jornada de trabalho. Ainda que esta não tenha sido objetivamente mensurada no estudo, fica evidente a diferença no acumulo diário da atividade física, o que por sua vez seria um fator que estaria associado ao desfecho do estudo – uma maior incidência de doenças coronárias nos motoristas do que nos cobradores.
O mesmo delineamento de pesquisa foi replicado nos trabalhadores da empresa de correios e telégrafos inglesa. E desta feita a comparação foi realizada entre os telefonistas operadores de telégrafo e os carteiros. O resultado da maior incidência de doenças coronárias foi também significativamente mais alta entre os telefonistas operadores de telégrafo do que entre os carteiros. O último grupo, naturalmente, acumulando uma maior quantidade de atividade física ao longo de sua jornada de trabalho.
Publicado em 1953, o estudo não recebeu muita atenção da comunidade científica na época, até porque as atenções em relação aos estudos epidemiológicos em cardiologia eram outras. Apenas em meados da década de 1980 – com um aumento dos eventos científicos da área de Atividade Física e Saúde, bem como uma maior atenção da área de saúde para as relações sobre o estilo de vida e os fatores associados como alimentação, ambiente e atividade física como importante fator de promoção de saúde –, foi que este estudo passou a ser considerado marco referencial da relação Atividade Física e Saúde, passando a ser citado em todos as publicações científicas, livros teses e artigos que se referissem ao tema.
Posteriormente, evidências ainda mais robustas foram surgindo e sendo publicadas por diferentes grupos de pesquisa em diferentes partes do mundo, inicialmente na área da medicina como tradicionalmente os estudos epidemiológicos surgem. Hoje, não só a medicina como a própria epidemiologia da atividade física, dispõe de evidências suficientes que demonstrem de maneira muito consistente a relação de associação entre atividade física e saúde, assim como, indistintamente, podemos também afirmar com muita propriedade a efetiva relação entre a inatividade física ou comportamento sedentário estar associado a incidência de uma série de DCNTs.
Novas evidências
No próximo ano o clássico estudo do Morris, completará 70 anos. Ao longo destas sete décadas, tanto as diferentes áreas da medicina, como a nossa área da Educação Física ou as demais Ciências do Movimento Humano como um todo, muito se desenvolveram, permitindo que cientistas, pesquisadores, grupos de estudos em diferentes centros de pesquisas nos mais diferentes lugares do mundo, produzissem cada vez mais evidências sobre o tema Atividade Física e Saúde. A ponto da Organização Mundial da Saúde (OMS) ter hoje uma divisão constituída destinada especificamente a cuidar deste setor, a Promoção da Atividade Física, e fomentar aos seus países membros inserirem em suas políticas púbicas de saúde a atividade física entre suas áreas de atenção e vigilância em saúde.
A mais nova relação da inatividade física com maior risco de doenças se deu recentemente no mês de fevereiro, quando o Centro de Controle e Prevenção de Doenças de Atlanta, nos Estados Unidos, publicou um documento em que insere a inatividade física com um dos seis fatores determinantes para um risco aumentado do desenvolvimento de COVID-19 Severa. Demonstrando mais uma vez, portanto, a importância da adoção de um estilo de vida ativo por parte das populações, assim como a diminuição do comportamento sedentário por parte das pessoas – não só no sentido de prevenir ou pelo menos diminuir o risco de se desenvolver DCNTs, mas também combater um dos maiores riscos recentes à saúde mundial, a pandemia da COVID-19.
Fotos: Adobe Stoke
Prof. Me. Luis Carlos de Oliveira é formado em Educação Física pela Escola Superior de Educação Física de São Caetano do Sul; Mestre em Educação Física; Doutorando em Educação Física e Saúde, Membro Diretor do CELAFISCS; Instrutor de Pesquisas em Ciências do Esporte; Coordenador do Projeto Internacional ISCOLE – Obesidade Infantil Ambiente e Estilo de Vida; Coordenador dos Cursos de Pós–Graduação da USCS/CELAFISCS; Professor da TREVISAN – Escola de Negócios; Assessor técnico-científico do Programa Agita São Paulo – Secretaria de Estado da Saúde; Membro da comissão organizadora do Simpósio Internacional de Ciências do Esporte
Muito legal. Parabéns
Fantástico texto, parabéns professor Luis Carlos